quinta-feira, 24 de junho de 2010

Câmbio, competitividade e capital humano

 
O Brasil é um país rico em recursos naturais. Por essa razão tem uma economia extremamente competitiva na produção de bens intensivos na utilização desses recursos e é um grande exportador desses bens...

Fonte: O Estado de São PauloO forte crescimento e a urbanização da China, um país pobre em recursos naturais, ampliaram a demanda por esses bens, com consequente aumento de seus preços. Isso fez crescer o valor e o volume das exportações brasileiras, gerou elevados superávits na balança comercial do País e tendência à valorização cambial. O aumento do fluxo de capitais internacionais para os países emergentes, em razão da expectativa de maior crescimento e de taxas de juros mais elevadas nesses países após a crise de 2008, exacerbou a tendência à valorização de suas moedas, inclusive o real.

A valorização cambial diminui os preços dos produtos importados, reduz a taxa de inflação, diminui a taxa de juros compatível com a estabilidade dos preços e, portanto, aumenta o bem-estar da sociedade. Porém, como diminui os preços dos bens importados, a valorização reduz a competitividade da indústria nacional e, no limite, pode levar ao fechamento de empresas industriais e à concentração da estrutura produtiva nos setores produtores de bens intensivos em recursos naturais, o que tornaria a economia dependente da evolução da demanda e dos preços desses bens no mercado internacional.

Diante do risco de "desindustrialização", muitos economistas defendem o controle sobre o fluxo de capitais e intervenções do Banco Central no mercado de câmbio para evitar a valorização "excessiva" da moeda. Ainda que esses instrumentos possam ser justificáveis diante da conjuntura atual, não são soluções estruturais para o problema. A questão é como aumentar a competitividade da indústria evitando que uma valorização conjuntural da moeda tenha efeitos deletérios sobre sua sustentabilidade.

O Brasil nunca teve uma indústria fortemente competitiva, exceto nos setores intensivos em recursos naturais. Nossa indústria depende de elevados níveis de proteção tarifária e não-tarifária e de fortes subsídios governamentais. O elevado grau de proteção reduz os incentivos a investimentos em ganhos de produtividade e na melhoria da qualidade dos produtos, o que diminui a competitividade do setor industrial. Reduzir a proteção à concorrência externa é um fator importante para mudar esses incentivos e aumentar a competitividade da indústria.

Mas um dos fatores mais importantes que determina a baixa competitividade da indústria brasileira é o fato de que o País tem uma combinação de pouco investimento em capital humano (educação, qualificação e saúde) e condições de trabalho e salários relativamente elevados, principalmente se comparados à maioria de nossos competidores asiáticos. Uma solução é adaptar as condições de trabalho no Brasil ao padrão asiático. A alternativa é aumentar a produtividade do trabalho, por meio de investimentos em educação e qualificação, tornando o estoque de capital humano do trabalhador brasileiro compatível com os custos do trabalho no País.

É impossível ter uma indústria competitiva sem força de trabalho educada e qualificada. Nenhum país conseguiu essa façanha. Ter uma indústria competitiva num país em que mais de 20% da força de trabalho é analfabeta funcional não é uma tarefa fácil. Da mesma forma que somente a abundância de recursos naturais torna a economia competitiva na produção de bens intensivos na utilização desses recursos, somente a abundância de capital humano fará a economia estruturalmente competitiva na produção de bens intensivos na utilização de capital humano. Esta é uma vantagem comparativa que é construída pelo país. Sem isso, nossa indústria estará sempre dependente de elevados níveis de proteção comercial e de políticas conjunturais que, além de não resolverem o problema, aumentam os preços e reduzem a qualidade dos bens industriais, diminuindo o bem-estar da grande maioria da população.

PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE ECONOMIA DA PUC/RIO E ECONOMISTA DA OPUS GESTÃO DE RECURSOS
José Márcio Camargo - O Estado de S.Paulo

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